Armados de boa vontade
Publish date 28-09-2016
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Ajudado também ajuda. Moradores do Arsenal da Esperança protagonizam ação solidária em uma das paróquias mais tradicionais de São Paulo.
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Uma única e árdua condição para participar da atividade solidária às quartas-feiras: chegar às 8h30 da “madrugada” no Arsenal da Esperança, localizado na Rua Dr. Almeida Lima, 900. Moça arrumada vai trabalhar, estudante universitário com fone de ouvido e alguns ambulantes. Um homem desperta sob cobertas rudes e quadriculadas pela lambida impertinente do cão amigo. Há quem prefira virar para o outro lado e tapar o sol com a peneira.
Toc Toc! Bato na porta. Nada. Entra um senhor e aproveito o ensejo. São 8h15. A disciplina férrea de quem trilha percursos de fé é quase militar. Ingresso na recepção e chega Simone Bernardi com sorriso bondoso. Esperando os demais noto santinhas debaixo do vidro redondo da mesinha central. Uma madona bizantina estampada. Surgem então meninas. Marias, Conceições e Aparecidas. A trindade amistosa e voluntária. Tati, Bruna e Ariana. Na sequência Marco Vitale com vitalidade inconfundível. Convoca e propõe a missão.
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– Não pega nada levar minha máquina de foto na mão por essas bandas? Paranoia urbana.
– Ôpa miss Simpatia, fica sossegada... O cara que pegar só vai ter tempo de sair feio na foto!
O grupo protege, socializa, entrelaça, diverte, homogeneíza, ganha confiança, cria códigos. Atrasados ou ligeiros, cada um no seu ritmo. Max Ferrero e Renata, um casal de fotógrafos italianos de Torino, nos segue e registra. Ela na cadeirinha de rodas com os olhos celestes e expressão generosa. Ele com uma barba grisalha e duas máquinas fotográficas estrepitosas dependuradas no obro. Giovanni conduz Renata desviando dos obstáculos. Mobilidade zero.
– Qual é a causa? Qual é o partido? Que manifestação é essa? É coisa da eleição, é?
Um senhor calvo e desconfiado desponta de um dos galpões do bairro e parece reconhecer uma cena já vista em nossos tempos polarizados.
Fazemos pontes, cruzamos horizontes inóspitos e finalmente chegamos ao local da ação! Uma casinha simples. De fora ninguém dá nada, não parece nem igreja. Assim seja! Um quadro no frontão traz nossa senhora e menino, negros. Representação de uma legendária história do sul da Itália contada pelos imigrantes italianos instalados no Brás. Reza a lenda - e o pároco - sobre o miraculoso presente deixado num convento do século XII por ter acolhido a mulher negra necessitada.
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Ripas de madeira, estruturas metálicas, sacos e sacrifícios. Parecem pescadores acostumados a puxar pesadas redes com habilidade. Olimpicamente os quase vinte homens revezam tarefas e desentulham o salão para a reforma do piso.
Solitário e carinhoso, o comentário de uma das senhoras da comunidade premia o esforço:
– Ah que bom se eu tivesse toda essa gente aqui todos os dias para me ajudar...
Um dos acolhidos, afadigado satiriza: – Bom pra ela... Não pra nós!
Um dos voluntários se aproxima sem nada dizer e me contempla com uma minúscula estátua de Moisés. Silenciosa como o Mar Morto, agradeço.
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Já no abrigo, banho e refeição. Depois, reunião reflexiva. O grupo repensa o feito. A assistente social escuta e sorri. Provê lugar de fala, recebe sem censura. Os “invisíveis sem voz” tornam-se nítidos e sonoros.
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A contraposição da maioria reconhece o florescer da semente mesmo na lama. Aqui ou noutras paragens. Ajudando quem precisa através do trabalho ou do ganho. Partilhando.
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O bem é bumerangue. Transformando a si, colaborando com os outros quem sabe o mundo muda. E o mesmo forno da guerra será capaz de forjar não mais as armas, mas sim almas. E das mais brilhosas.
14.09.2016 – Texto & Fotos por Nina Ratti
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